Desapropriação no Cajueiro traz à tona suspeitas de irregularidades na expedição de alvarás de construção pela prefeitura de São Luís

Há pelo menos uma década, o Ministério Público do Maranhão vem recebendo informações e documentos sobre a existência de uma máfia que atua no setor imobiliário de São Luís e a ligação dessa organização com funcionários da própria prefeitura da capital. Agora, depois de anos de denúncias, veio a público a suspeita de que o suposto esquema responsável pela aprovação de edificações de médio e grande porte da cidade, estaria funcionando na própria Secretaria Municipal de Urbanismo e Habitação de São Luís (Semurh).

De acordo com as informações obtidas com exclusividade pelo blog, a suposta máfia permitiu a expedição de 120 alvarás de construção e habite-se, entre 2009 a 2016, durante o último ano de gestão do primeiro mandato do prefeito Edivaldo de Holanda Júnior (PDT). Nesse período, a empresa WPR São Luís Gestão de Portos conseguiu, misteriosamente, junto à prefeitura dois documentos para viabilizar a instalação do Porto São Luís, localizado na Comunidade Cajueiro, na zona rural de São Luís.

A comunidade integra a área do projeto da Reserva Extrativista Tauá-Mirim, em curso no Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), e que aguarda, desde o ano de 2003, posicionamento do governo do Maranhão para sua criação.

Por conta da emissão dos documentos, a Defensoria Pública do Estado (DPE), através do Núcleo de Moradia e Defesa Fundiária, obteve sentença que determinasse a abstenção, por parte da WPR São Luís, de atos que impediam a realização de plantações, de construções, do extrativismo e da pesca pela comunidade do Cajueiro, situada na região da Vila Maranhão, na capital.

A decisão foi fruto de medida cautelar preparatória de ação civil pública movida pela DPE contra a empresa, que pretende instalar no local um terminal portuário e vinha proibindo, na época, através de uma empresa de segurança, a comunidade de utilizar o seu território, inclusive, impedindo o acesso às praias de Cajueiro e Parnauaçu. Na sentença, o juiz Clésio Coelho Cunha confirmou inteiramente decisão liminar proferida em outubro de 2014 pelo titular da Vara de Interesses Difusos e Coletivos da capital, Douglas de Melo Martins, que estava licenciado.

A intervenção da DPE também garantiu, a revogação de decisão liminar, proferida em mandado de segurança da WPR São Luís, que determinava ao ex-secretário Municipal de Urbanismo, Diogo Diniz Lima, que restabelecesse os efeitos da certidão de uso e ocupação do solo emitida em favor da empresa e, posteriormente, por este suspensa seguindo recomendação da Defensoria.

A decisão cancelada havia sido proferida durante um breve afastamento do titular da 2ª Vara da Fazenda Pública da capital, Carlos Henrique Veloso, que, ao retornar, diante dos fatos apresentados e comprovados pela Defensoria Pública do Estadual, principalmente quanto à suspensão administrativa do processo de licenciamento ambiental pelo Estado do Maranhão, revogou a liminar concedida por seu substituto.

Ao tornar sem efeito a liminar, ressaltou o magistrado que, ainda que fosse concedida a antecipação de tutela, a WPR não poderia promover a instalação de seu empreendimento no local pretendido, em face da suspensão do licenciamento ambiental, sendo impossível juridicamente o deferimento do seu pedido neste momento processual.

Na recomendação endereçada e acolhida pela Secretaria de Urbanismo e Habitação (SEMURH), a DPE sustentava que, segundo a legislação de uso e ocupação do solo vigente, dentre as atividades admitidas para a Zona Industrial 3 (ZI3), onde a WPR pretende instalar seu empreendimento, não está inserida a atividade portuária.

Destaca ainda que os empreendimentos portuários já existentes na citada Zona Industrial (Vale, Alumar e Itaqui) teriam sido implantados anteriormente à vigência da referida lei, sendo, portanto, seu uso e expansão tolerados, pois configurariam direito adquirido.

O documento que atesta os potenciais usos de um determinado imóvel à luz da legislação urbanística, emitido pela Semurh, faz questão de destacar que a ‘instalação’ do porto privado está numa área inadequada. Emitida no dia 28 de novembro de 2014, a certidão de uso e ocupação do solo foi assinada pelo então secretário adjunto da Semurh, Praxedes Sousa Marques.

ALVARÁ DA ELEIÇÃO

Outro ponto que chama a atenção é o valor do alvará de construção do empreendimento em favor da WPR, de R$ 738.991,53. O documento com validade até 29 de janeiro de 2020, foi assinado pelo ex-secretário Diogo Lima, no dia 29 de janeiro de 2016, ano em que o prefeito Edivaldo Júnior disputou sua reeleição e o ex-auxiliar teria atuado com operador de ‘captação’ de recursos para custear a campanha eleitoral.

ESQUEMA MOTIVA AÇÃO

As suspeitas de irregularidades na expedição de alvarás de construção e habite-se pela Semurh, levou o Ministério Público do Maranhão (MPMA) a ajuizar, em 11 de abril deste ano, Ação Civil Pública com pedidos de obrigação de fazer e tutela de urgência contra o Município.

Na ação, a promotora de justiça Márcia Lima Buhatem (que atualmente responde pela Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente, Urbanismo e Patrimônio Cultural da capital), requer que o Município seja condenado a fiscalizar e regularizar, em 90 dias, todas as pendências nos alvarás e habite-se dos 120 imóveis, sob pena de pagamento de R$ 100 mil diários.

A manifestação ministerial é baseada na representação feita, em maio de 2013, pela chefe de assessoria da Semurh, Ana Helena Ferreira Paiva. Além da falta de pagamento pela expedição dos alvarás e dos habite-se, a chefe da assessoria relatou a concessão destes antes do final dos processos e a ausência das assinaturas do ex-secretário Domingos Brito e do ex-secretário-adjunto Walburg Gonçalves Neto, nos referidos documentos.

SEM AUTORIZAÇÃO

Apesar da obrigação de que todo documento de licenciamento emitido pela Semurh seja assinado pelo secretário, secretário-adjunto, superintendente de Urbanismo e coordenador de Aprovações foram encontrados alvarás e habite-se assinados unicamente pelo servidor do núcleo de capacitação de Receita da Semurh, José de Ribamar Pires Braga, sem a devida autorização legal. Nos documentos em favor da WPR, por exemplo, das quatro assinaturas necessárias, constam duas: a do secretário e do adjunto.

Na lista de imóveis cujas permissões foram concedidas de forma irregular estão imóveis localizados nos bairros do Calhau, Renascença, Ponta D’Areia, Olho D’Água, Recanto dos Vinhais, Forquilha, São Cristóvão, BR-135, Vila Maranhão e Turu, entre outros. Figura, ainda, na lista um imóvel de propriedade do próprio ex-secretário Domingos Brito, localizado na Rua São Geraldo, no Jardim de Allah.


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