Nossa vida parece mais complexa, mais exigente e mais pesada do que podemos suportar

Quando você percebe que não vai dar conta. Quando você percebe que tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo, muitas tarefas para uma só semana, muitas portas abertas, muitos entraves aparentemente intransponíveis, muitos problemas envolvendo todas as estruturas sociais, muitos movimentos em diferentes âmbitos e escalas (sendo que você poderia passar uma vida inteira apoiando cada um deles).

Quando você percebe que mencionou outros continentes, comunidades inteiras, grandes mestres espirituais e até seres sem nome que ainda não nasceram ao fazer uma simples reunião de trabalho para conciliar três agendas pessoais nos próximos meses. Quando tudo se expande mais do que o esperado, até mesmo você. Quando cada email que chega em sua conta é direcionado a pessoas diferentes, de mundos diferentes, com inteligências diferentes, com linhas do tempo diferentes, ainda que todos comecem com o seu nome.

Quando percebe que não vai dar conta, você pode reagir em dois extremos: se achar pra cima (como se você fosse maior, com o poder de orquestrar tantos movimentos) e se achar pra baixo (como se você não tivesse espaço suficiente para presenciar tantos movimentos). Ambos os extremos vem de focar demais em nós mesmos. Orgulho e desespero são contrações do autointeresse, pensamentos desnecessários que adicionamos à realidade.

Aquilo que nos tensiona é justamente aquilo que pode nos abrir. É como soprar uma bexiga: o ar que estica a pele é o mesmo ar que estoura a bexiga. Mas isso só acontece quando vamos em direção a não mais dar conta (não evitando, não contendo, não moderando), tanto é que para esvaziar uma bexiga de modo que ela nunca mais se encha, o método não é esvaziar, mas encher até estourar. Se tentamos fugir, o mero fluir do relógio da vida cotidiana parece nos perseguir, nos oprimir, nos castigar, nos esmagar, nos soterrar.

Esse não mais dar conta não precisa ser uma sobrecarga de estímulos hedônicos, tarefas, ocupações, distrações, fugas, entorpecimentos. Esse não mais dar conta pode ser uma conexão com a realidade complexa da vida: uma mistura inconcebível de sofrimento com lucidez, ambos incomensuráveis. É um simples reconhecimento de que a vida não se contém. É um relaxamento: não temos como dar conta — e nem precisamos!

Nós não somos esse que nunca dá conta, somos isso que parece nos demandar de um lado para o outro, somos isso que parece nos esticar, não somos bexiga, somos ar.

A expressão que primeiro usamos para falar da tensão, da frustração, do estresse, da sobrecarga — “Não consigo dar conta!” — é a mesma expressão que podemos usar para nos alegrar com tamanho alívio!

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